Revista IstoÉ - 12 de janeiro de 2005

Close urbano

O fotógrafo centra seu foco na solidão

Eliane Lobato

Há articulações paralelas e constantes em O fotógrafo, de Cristovão Tezza (Rocco, 224 págs., R$ 27). Uma delas é a dimensão do tempo através da imagem clicada. O fotógrafo conhece seu poder de congelar o tempo ou pôr um passe-partout na realidade, fragmentando a parte como se fosse o todo. O protagonista deste romance resume de forma simples: “As coisas devem durar.” Outro coadjuvante da trama é o jogo da vida – ou a vida como um jogo. Um clique pode mostrar alguém ou uma situação em seu melhor ou pior ângulo, isso vai depender do pacto entre quem está atrás e à frente da câmera. Depende de quem tem mais a perder ou, pior ainda, se ninguém tem nada a perder. A coordenada mais cruel talvez seja a capacidade de eternizar uma mentira. O que dizer diante de uma foto em que marido, mulher e filha sorriem quando, na verdade, o casamento está estilhaçado e a felicidade por um fio? A bem da verdade, a felicidade no papel apenas remete à vulnerabilidade da vida – este é o drama do personagem central.

Nas hábeis mãos do autor de Juliano Pavollini – um dos mais bonitos romances brasileiros – tudo isso vira uma obra sensível, densa e, ao estilo de Tezza, de leitura agradável. Apesar do acolhimento de variadas articulações, o foco central é a solidão. Mas não como sinônimo de fracasso e sim como um traço imprescindível da natureza humana. A história fala de um homem sem nome em crise total. Sua vida pessoal está destroçada – a mulher tem um amante – e, profissionalmente, as coisas não vão muito bem. Ele é contratado para fotografar secretamente uma jovem e ganhar US$ 200 por filme. Toda a trama se passa em um único dia, às vésperas da eleição presidencial de 2002. O cenário é Curitiba, cidade adotada pelo autor, nascido em Lages, Santa Catarina. Fotógrafo amador, Tezza soube usar as metáforas, como a do quarto escuro no qual se espera uma revelação.


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